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Em português brasileiro, assim como no português europeu, e em diversas outras línguas latinas, existe na gramática uma característica conhecida como Concordância Nominal. Esse termo, assim como grande parte dos termos da gramática portuguesa, e de todas as outras línguas, é muito mais difícil de explicar do que de se utilizar, ou seja, o nome faz a coisa parecer muito mais assustadora do que realmente é (e não seria essa a principal razão do horror de muitos alunos e, consequentemente, da repulsa de muitos cursos de línguas à utilização do “gramatiquês”).

 

Bom, porém, como eu disse acima, a coisa é muito mais fácil de se utilizar do que de se explicar. Por isso, vou tentar explicar primeiro, sem fazer uso de um exemplo, meio que só de birra e para comprovar tal tese.

 

Pela terminologia “Concordância Nominal”, entendemos que todos os “nomes” da frase devem concordar entre si. Ou seja, todas as palavras que forem “nomes” (adjetivos, artigos, substantivos) devem estar no mesmo número e gênero, desde que façam parte do mesmo grupo, ou seja, se refiram, denotem, a mesma coisa. Complicado não? Vejamos então, um exemplo:

Comprei um pão francês ontem

 

Comprei dois pães franceses ontem

Na primeira frase o grupo nominal (no caso a coisa que eu comprei) se encontra no singular (porque comprei apenas uma coisa, ou melhor, um pão francês), pão francês se encontra no singular em todas as suas partes (pão e francês). Logo, os dois termos estão concordando em gênero (ambos se encontram no masculino) e número (ambos se encontram no singular). Raciocínio análogo vale para o exemplo posterior no qual o grupo nominal se encontra no plural.

 

Essa é uma regra muito simples e intuitiva da língua portuguesa ( e de outras línguas latinas) e é usada em praticamente todos os níveis de linguagem (formal ou informal) e por quase todo o país. Sim, eu disse quase. Porque não existe plural em SP (São Paulo). São Paulo é a terra onde não existe plural, principalmente na linguagem falada e às vezes independendo do nível de formalidade (a menos é claro, que seja um discurso oficial). Ao contrário do que se pensaria normalmente, essa falta de plural é uma prática muito mais difundida na cidade de São Paulo (na capital) do que no Interior (sim, o interior é caipira, mas grande parte dele faz uso do plural).

 

São Paulo, no país da maior e mais famosa selva do mundo, é carinhosamente conhecida como a selva de pedra. Uma megalópole que, somando-se as cidades com as quais se conurbou, possui XX milhões de habitantes.

 

Se o Brasil foi realmente feito em um caldeirão étnico e cultural, em nenhum outro lugar do país foram utilizados tantos ingredientes diferentes. Europeus, asiáticos, negros, migrantes de várias regiões, partricinhas, manos, emos… Todos se encontram em São Paulo. Nenhuma outra cidade é tão plural. São Paulo, a única grande cidade brasileira que não é portuária, e que se desenvolveu tanto, justamente por ser o local em que várias estradas (e caravanas) se encontravam. Ou seja, à moda de Roma, todos os caminhos levam a São Paulo.

 

Mas, lá existem paradoxos. Porque até mesmo os paradoxos se encontram nessa imensa encruzilhada que é paulicéia. Milhões de opções culturais e uma mobilidade urbana imóvel. A extrema riqueza e a extrema pobreza, praticamente lado a lado. Lindos monumentos e prédios abandonados, em um vocabulário Caetanístico, coisas belas que são erguidas e destruídas pela força da grana. Então, o fato de a cidade mais plural do país ignorar o plural na língua (na língua falada) e apenas mais um desses paradoxos e, aparentemente o menor deles.

 

No próximo artigo, discutiremos como, quando e porque (em um mero levantamento de hipóteses) isso ocorre.

 

Comentários sobre São Paulo: A cidade singular